quinta-feira, 13 de outubro de 2011

A mídia e os desastres naturais

A mediação interessada, tantas vezes interesseira, da mídia, conduz, não raro, à doutorização da linguagem, necessária para ampliar o seu crédito, e á falsidade do discurso, destinado a ensombrear o entendimento. O discurso do meio ambiente é carregado dessas tintas, exagerando certos aspectos em detrimento de outros, mas, sobretudo, mutilando o conjunto. (...) O que, em nosso tempo, seja talvez o traço mais dramático, é o papel que passaram a obter, na vida quotidiana, o medo e a fantasia. Sempre houve épocas de medo. Mas esta é uma época de medo permanente e generalizado. A fantasia sempre povoou o espírito dos homens. Mas agora, industrializada, ela invade todos os momentos e todos os recantos da existência a serviço do mercado e do poder e constitui, juntamente com o medo, um dado essencial de nosso modelo de vida. (...) Se antes a natureza podia criar o medo, hoje é o medo que cria uma natureza mediática e falsa, uma parte da natureza, sendo apresentada como se fosse o todo.

Milton Santos (1992): A Redescoberta da Natureza.

Os meios de comunicação têm noticiado de maneira bastante alarmista, diversos problemas globais relacionados à degradação do meio ambiente, principalmente os de grande magnitude, como os deslizamentos de terra, inundações, furacões, etc. Sabe-se que os eventos pluviométricos extremos, ocorrem de tempos em tempos, tanto que uma das variáveis analisadas em inundações consiste no Tempo de Retorno (TR), que é o tempo médio em anos que evento é igualado ou superado pelo menos uma vez.

Pintura de Carlos Fabra sobre o suposto Tsunami ocorrido na vila de São Vicente em 1542. Fonte: http://www.labjor.unicamp.br/

            Principalmente nesse momento que vivemos se faz necessário refletir sobre o fato de eventos desse porte, adquirirem o caráter de “sobrenaturais”. É preciso discernir sobre sua gênese. Eventos como esses, na sua maioria, sempre ocorreram, são conseqüência da dinâmica natural do planeta, e continuarão a ocorrer. O principal nesta questão é dar mais enfoque para o planejamento ambiental e social, do que para o planejamento econômico, mais presente atualmente.
            A relação do homem com a natureza ocorre historicamente através de uma aceitação e submissão fatalista dos desastres naturais, e uma visão equivocada de desenvolvimento tecnológico. Por exemplo, devemos compreender que as áreas de preservação permanente devem ser protegidas, ou seja, não podem ser ocupadas, pois, comprovadamente são importantes na preservação da fauna e da flora, além disto, compõem muitas vezes uma área natural de inundação dos rios, ou uma área de provável ocorrência de deslizamento, em caso de alta declividade.
            Não defendemos aqui que os “errados” são os moradores que ocupam essas áreas. Muitas vezes escutamos frases como: “Quem mandou ir morar lá?”, no entanto, é preciso destacar que devido à especulação imobiliária, os imóveis ficam com preços abusivos, o que acaba deslocando a população para áreas com valores mais acessíveis, em detrimento de qualidade de vida e segurança. Em alguns municípios do interior do Rio Grande do Sul, existem 3 possibilidades: residir em áreas de inundação, residir em áreas de alta declividade, ou pagar muito caro por uma residência em área com qualidade de vida.

Pintura do século XIX de Benedito Calixto retratando alagamento na Várzea do Carmo (SP), hoje centro da capital paulista. Fonte: http://www.cptec.inpe.br/noticias/imprimir/11955

            Enquanto isso, alguns gestores municipais, não dão a devida atenção para o planejamento ambiental, afinal, após a ocorrência de desastres naturais, tem-se ajuda da defesa civil ao decretar situação de emergência, e é realizada a reconstrução. O fato é que, mesmo que diversos estudos indiquem que para cada R$ 1,00 investido em prevenção, são gastos R$ 30,00 em reconstrução, enchendo os cofres das empreiteiras, as prefeituras não tomam atitude par reverter esta lógica.
            Assim, torna-se necessário mais do que nunca, que haja uma maior conscientização e participação da comunidade e dos gestores públicos em relação ao planejamento ambiental e às reais causas, conseqüências e alternativas que se tem diante da ocorrência de desastres naturais. Quanto à mídia, se vê freqüentemente uma parte voltada para o meio ambiente, para se considerar “na moda”, embora muitas vezes temas como meio ambiente e sustentabilidade sejam totalmente descabidos e vulgarizados, nisso, pelo menos propiciou que as pessoas mais “desligadas” tivessem uma pequena aproximação, com a temática ambiental.  Melhor do que nada.